Foto: Vinicius Becker (Diário)
Ao completar dois meses da ocupação indígena na área da antiga Fepagro, onde funciona a sede da Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI) Boca do Monte, a comunidade escolar decidiu, em reunião com a prefeitura de Santa Maria, pelo retorno das atividades letivas ao local original. A medida, no entanto, ainda depende da execução de um plano de segurança reforçado.
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A decisão foi tomada na noite de terça-feira (16), durante encontro realizado no Clube Concórdia, com a presença de pais, responsáveis, autoridades municipais e representantes da Secretaria de Educação. A votação, restrita aos responsáveis legais pelas crianças, definiu pelo retorno à EMEI Boca do Monte, atualmente desativada desde a ocupação por um grupo indígena, em 15 de julho. Até então, os alunos estavam sendo atendidos provisoriamente na Escola Estadual de Ensino Fundamental (EEEF) Almiro Beltrame.
Segurança será reforçada, promete prefeitura
O Plano de Segurança, prometido aos pais pela prefeitura, contará com vigilância privada, monitoramento por câmeras ao longo do trajeto até a escola e suporte do Centro Integrado de Operações de Segurança Pública de Santa Maria (Ciosp). O retorno está previsto para ocorrer em até 15 dias, após a reinstalação de mobiliário e equipamentos.
A secretária de Educação de Santa Maria, Gisele Bauer, destacou a importância da participação da comunidade escolar na construção da solução.
– A decisão foi democrática e respeita a vontade da maioria dos pais, que querem a escola funcionando próximo de casa. Ainda assim, o município entende que precisa oferecer segurança e acolhimento para todos, sem exceção – disse.
Uma nova reunião com a comunidade escolar deve ocorrer após 30 dias do retorno, com o objetivo de acompanhar a situação de forma contínua.
O que pensam os pais
Apesar do apoio da maioria dos pais à volta das aulas para a sede original da EMEI Boca do Monte, nem todos concordam com o retorno. A advogada Mariana Zanini, 36 anos, mãe de uma das crianças atendidas pela instituição, manifestou preocupação com a segurança:
– Eu me posicionei contrária porque não vi mudanças efetivas desde a última reunião. A segurança ainda preocupa. e os ânimos continuam exaltados. Fiquei sem resposta quando questionei o que mudou desde então – afirmou.
Segundo Mariana, a prefeitura apresentou três alternativas: retorno à Fepagro com reforço na segurança, redistribuição das crianças para outras escolas ou ampliação do transporte escolar. A primeira foi escolhida por maioria dos pais presentes.

Já a moradora Fernanda Link Saccol, 44 anos, mãe de um aluno do maternal, foi uma que votou pelo retorno. Ela relembra que o processo teve início com uma decisão repentina, que deixou muitos pais insatisfeitos, mas destaca a importância da recente reunião com a prefeitura.
– O início foi marcado por uma transferência autoritária para outra escola, sem diálogo. Mas, agora, houve escuta, houve esforço para garantir segurança. Não é a solução perfeita, a escola ainda está perto da área ocupada, mas acreditamos que o reforço prometido dará condições para um retorno seguro – explica.
Fernanda destaca que o deslocamento até a escola provisória foi um dos principais motivos da decisão pela volta. Segundo ela, muitas crianças estavam frequentando as aulas de forma esporádica ou parado por completo, devido ao desgaste físico e emocional da longa viagem.
Ainda de acordo com a moradora do distrito de Boca do Monte, os pais deram um voto de confiança às autoridades, especialmente após o compromisso assumido por representantes do município de que haverá vigilância privada, câmeras de monitoramento e uma nova reunião para avaliar a situação.
Comunidade indígena defende convivência pacífica
O grupo indígena caingangue que ocupa parte da área da antiga Fepagro permanece no local, conforme acordado em audiência de conciliação realizada no fim de agosto. Segundo o advogado Gabriel Soares, que representa os indígenas, a comunidade cumpre todas as determinações judiciais e defende a permanência pacífica:
– A comunidade indígena quer seguir convivendo de forma harmoniosa com os moradores da Boca do Monte, sem interferir nas atividades da escola ou nas pesquisas locais. Inclusive, foram colocadas faixas na região demonstrando apoio à continuidade da EMEI.
Ainda segundo o advogado, rumores sobre a chegada de novos indígenas ao local foram desmentidos judicialmente, com apoio do Ministério Público Federal e da Defensoria Pública da União.
Processo judicial segue em andamento
Enquanto a solução definitiva sobre o destino dos indígenas não vem, o processo de reintegração de posse segue tramitando na Justiça Federal. A expectativa, segundo a Procuradoria Jurídica do município, é que o Estado indique uma área de cerca de 15 hectares para permanência da comunidade indígena, sem impacto sobre a escola ou outras atividades.
– O que gera insegurança é a ausência de decisões definitivas. Assim que o Estado e a Justiça Federal se posicionarem, acredito que a comunidade poderá viver com mais tranquilidade – avaliou a secretária Gisele Bauer.
Relembre: ocupação na Fepagro e impactos na EMEI Boca do Monte
- 15 de julho de 2025 – início da ocupação: cerca de 30 indígenas da etnia caingangue ocuparam parte da área da antiga Fepagro, no distrito de Boca do Monte. Na mesma data, a Emei Boca do Monte, situada na mesma área, é esvaziada e tem as aulas suspensas por precaução.Brigada Militar é acionada para acompanhar a situação.
- Em 21 de julho, o recesso escolar é antecipado. A medida visa garantir a segurança das crianças e funcionários da instituição.
- Já no dia 5 de agosto, pais de alunos da Emei protestaram em frente à área da Fepagro, exigindo o retorno das aulas e uma solução para o impasse. No dia seguinte (6/8), foi realizada a primeira reunião da comunidade escolar na Escola Estadual Almiro Beltrame (onde os alunos estavam sendo atendidos provisoriamente).
- Em 8 de agosto houve uma audiência de conciliação na Justiça Federal com a presença de representantes do Estado, MPF, Prefeitura e comunidade indígena. Na ocasião, ficou acordado que o Estado estudaria a destinação de uma área de 15 hectares da Fepagro para uso do grupo indígena, no prazo de 30 dias.

- 29 de agosto – moradores do distrito realizaram novo protesto em frente à área ocupada após rumores sobre possível chegada de mais indígenas, o que não se confirmou.
- No início de setembro, o Estado protocolou um novo pedido judicial de reintegração da área.
- Na última terça-feira (16), a maioria dos pais votou pela volta à sede da Emei na área da Fepagro. A previsão de retorno às aulas é de até 15 dias.

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